Uma das utopias dos obstetras é descobrir um jeito extremamente eficaz de predizer se a criança deixará o ventre materno antes do momento esperado. Esse sonho, compartilhado pelos futuros pais, instiga os cientistas a investigar métodos mais aptos a profetizar o término exato da gravidez e acertar em cheio a data do nascimento.
Com essa informação em mãos, seria possível acompanhar a gestação com cautela e, quando necessário, dispor de medidas terapêuticas com o objetivo de postergar a chegada do pequeno. Isso porque os especialistas estão cansados de saber que o fruto de um parto precoce, aquele que se antecipa à 37a semana, costuma sofrer para ingressar no mundo pósbarriga. “A prematuridade é a principal causa de morte e complicações dos recém-nascidos”, afirma o obstetra Roberto Bittar, do Hospital das Clínicas de São Paulo.
Nesse cenário, a ideia de pesquisadores sediados em Gotemburgo, na Suécia, foi analisar um painel de proteínas encontradas no colo do útero e no líquido amniótico que acusam se a gestação se encerrará antes dos nove meses. Em um trabalho publicado no periódico do Colégio Americano de Obstetrícia e Ginecologia, eles mostraram, após avaliar 89 mulheres, que o teste de rastreamento dessas substâncias teria uma eficiência de 90%. Quando o resultado é positivo, há razões suficientes para os especialistas interferirem para segurar os eventuais bebês apressados.
A identificação desses marcadores de risco abre caminho a um exame ainda mais preciso para o pré-natal. Talvez nem todas as gestantes necessitem se submeter a ele um dia — que seja útil apenas às pacientes de risco. “Tudo vai depender do custo/benefício”, opina o obstetra Tenílson Amaral Oliveira, do Hospital Israelita Albert Einstein, na capital paulista. A vantagem seria apontar com maior precisão, entre aquelas em pretenso trabalho de parto, quem, de fato, vai dar à luz mais cedo.
Já na Inglaterra, cientistas do Imperial College London desvendaram uma proteína-chave no desenrolar desse quadro. Eles notaram que a substância comanda um processo inflamatório responsável por contrações anormais do útero. E conseguiram brecar, em laboratório, as reações disparadas por ela. Até que o mesmo resultado se concretize no corpo feminino, há alguns anos pela frente. O desafio não é pequeno devido à complexidade do assunto. “Ainda estamos longe de saber tudo o que está relacionado ao trabalho de parto prematuro”, diz Bittar.
Embora a maioria dos partos prematuros seja espontânea, uma parcela é induzida pelos próprios especialistas. “Em 25% dos casos o médico opta por interromper a gestação antes dos nove meses”, estima Bittar. “É uma prematuridade terapêutica, porque o objetivo, aí, é salvar a vida da criança”, justifica o obstetra Soubhi Kahhale, do Hospital e Maternidade São Luiz, em São Paulo.
O procedimento, também adotado se a gravidez oferece perigo à mãe, entra em cena quando uma doença materna impõe sofrimento ao pequeno. “A hipertensão, por exemplo, dificulta o fluxo sanguíneo para o feto, diminuindo o fornecimento de oxigênio e nutrientes e oferecendo até ameaça de morte”, explica o obstetra Olimpio Barbosa de Moraes Filho, da Universidade de Pernambuco.
Por isso, é imprescindível escoltar a gestação e suspeitar do que interfere em seu desfecho precoce — espontâneo ou não. Afora o acompanhamento clínico, hoje existem dois exames que visualizam o adiantamento da cegonha. Esses métodos costumam ser preconizados, a partir da 22a semana, a gestantes de risco, que já tiveram partos prematuros ou com dores e contrações intensas. O primeiro se vale de um ultrassom para medir o colo do útero. “Quanto menor o tamanho, maior a chance de um parto prematuro”, resume Tenílson Oliveira.
E o segundo é a dosagem de fibronectina, uma proteína coletada na vagina que indica a probabilidade de um nascimento ser capaz de furar o calendário. Normalmente, esse dedo-duro fica colado à membrana que recobre o feto. “Quando ela começa a desgrudar por causa das contrações, a fibronectina se desprende em direção à vagina”, explica Oliveira. “Se o resultado do teste for negativo, a chance de a paciente ter parto prematuro é menor que 1%”, conta Bittar. O problema é a situação inversa. “O exame resulta em muitos falsos positivos. Metade das mulheres com uma resposta afirmativa não enfrentará um parto antes da hora”, reconhece Tenílson. Ainda assim, por precaução, a presença da tal proteína sugere um cuidado redobrado com a grávida, que, se preciso, deve ser hospitalizada.
Outra medida revolucionária na prevenção do parto precoce foi introduzida por uma equipe do Hospital das Clínicas paulistano há seis anos. Ela provou que o uso de progesterona natural, o hormônio que mantém a gestação, é uma estratégia segura e eficiente para prolongar a estada do bebê no útero. “A progesterona reduz em 50% o risco de prematuridade em mulheres com histórico do problema”, diz Bittar, que orientou os estudos. Ela deve ser aplicada diariamente na forma de uma cápsula introduzida na vagina. “Utilizado entre a 16a e a 36a semanas de gestação, o hormônio diminui as contrações do útero e é um anti-inflamatório local.”
Quando há fortes indícios de que o novo integrante da família chegará com antecedência, os médicos também lançam mão de recursos que visam ao menos adiar em até algumas semanas o fim da gravidez. “Hoje há drogas inibidoras de contração sem os efeitos colaterais do passado”, diz Kahhale. Sem falar em tratamentos que garantem o melhor desenvolvimento da criança. Tanto esforço faz sentido. “A melhor UTI neonatal é o ventre materno, desde que, é claro, ele não esteja prejudicando o bebê”, sentencia Kahhale.